PROJETO 4 – EDIFÍCIO HABITACIONAL
ANDRÉ ROMITELLI
“Uma parte de mimé todo mundo:outra parte é ninguém:fundo sem fundo.uma parte de mimé multidão:outra parte estranhezae solidão.”
Ferreira Gullar – “Traduzir-se”
Os caminhos
que percorremos na cidade estão cada vez mais perigosos. Mas são os muros que
delineiam as permanências que tornam os espaços mais seguros? Ferreira Gullar,
em sua coluna semanal no caderno “Ilustrada”, fala este Domingo sobre uma noção
de segurança nas praças e logradouros cariocas dada graças às grades que os
circundam. Como se as mesmas fossem
filtro demográfico, o interior de tais praças deixou de ser povoado por
moradores de rua e passou a abrigar crianças e o poeta em suas vãs andanças.
É curioso
notar essa crescente noção de segurança atrelada ao isolamento das porções de
habitantes de uma cidade: o direito de ir e vir não é bloqueado pelas grades
que cercam as praças, as próprias pessoas que o freqüentam –e sua ausência- o
fazem. Essa que é a verdadeira noção de
segurança nos caminhos que formam a cidade: o olhar do outro; o que garante o
fluxo de pessoas nas calçadas das cidades são as próprias pessoas. Passeios
largos e bem projetados são um convite ao transeunte, e este é um alento de
segurança ao outro pedestre. As cercas, grades e muros dão noções de uma
segurança muito mais frágil e instável, que dispensam citar os exemplos de
atentados, assaltos e roubos em shoppings, escolas e caixas eletrônicos.
Se a praça
do Leme tornou-se um lugar mais ou menos seguro, não posso garantir, afinal,
nunca estive no Rio de Janeiro. Mas essa noção de vizinhança que convida ao
carteado, ao jogo de damas e a permanência tem um papel muito mais influente em
manter a segurança do local do que as grades que o circundam. E se os cidadãos
que fazem parte desta rotina estiverem dispostos ao convício, as grades sairão
como se nunca tivessem sido postas.
No bairro
de Santa Cecília nota-se o mesmo convívio em comunidade que Ferreira Gullar
retrata em sua coluna, mas, é claro, em uma escala diferente. O Largo do
Arouche é facilmente reconhecido como um elemento do passado de “ouro” da
região, característico pelos casais fazendo o chamado “footing” nos finais de
tarde, e crianças povoando as praças durante o dia. Hoje o cenário ainda é
habitado, em grande parte pelos moradores de rua que praticam a chamada
“esmola”, em contraste com aqueles que vivenciaram o passado ao qual me refiro.
São inúmeros os contrastes presentes na região, e uma briga característica dos moradores
contra o sucateamento do bairro, dado a partir da instalação do Elevado Costa e
Silva na gestão de Paulo Maluf. Enfim, é fácil coletar depoimentos de moradores
que clamam por um passado cujos resquícios se dão pela presença de alguns
poucos sobrados da época em claro estado de degradação. Muito embora o bairro
tenha sofrido mudanças, seus moradores não acompanharam e adaptaram-se a elas,
surgindo um conflite de interesses.
A população
que busca o bairro hoje como morada é formada majoritariamente pelo público que
atende aos serviços da Santa Casa, médicos e enfermeiros, e estudantes. São uma
fatia da sociedade que prezam por um processo de re valorização da região e
clamam por um processo de higienização que vem acontecendo em todo o centro
paulistano. Para isso, enclausuram-se dentro de grandes e falsos muradas, com
guaritas e sistemas de vigilância, cuja ineficácia é cada vez mais comprovada.
Enquanto isso, as ruas tornam-se reduto dos moradores de rua, afinal, a
população evita vivenciar a cidade.
TERRENO e cidade
Com os
cenários utópicos do século XXI escasseando, perigamos fazer análises sobre a
cidade que se confundam com sofismos desnecessários, mas é um ponto crucial
analisarmos o entorno de um terreno, suas características sócio econômicas e físicas
antes de estabelecermos um vínculo projetivo. Por isso, por enquanto, me atento
mais aos fatores externos ao terreno, ainda mais em um espaço cuja topografia
apresenta-se discretamente, disfarçada entre os edifícios ao redor. Portanto,
uma primeira análise nos demonstra claramente esse intrínseco vínculo entre o
sítio e os elementos que o circundam, analisados a seguir.
Dentro de
todos os elementos que envolvem nossa área de estudo podemos distinguir dois
grupos maiores e distintos: os fatores abióticos e os bióticos; que
correspondem aos objetos vivos e aos não vivos que exercem influência sobre a
região. Grosso modo, o primeiro grupo engloba os edifícios, automóveis, lixo e
estruturas urbanas, como o elevado e postes, fios e placas; com elementos vivos
quero destacas todos aqueles fatores naturais que englobam os elementos que
garantem a cinética e os fluxos da cidade. Dadas divisões são suficientes para
compor uma análise da paisagem urbana de modo a analisar tanto suas tipologias
físicas, quanto seus padrões sócio econômicos.